Taí uma pergunta que até o Google se atrapalha ao responder: o que o consumidor realmente espera das empresas? Produtos de qualidade e excelência nos serviços podem ser as primeiras opções a vir à cabeça. Mas estão longe de serem suficientes. Os desejos do consumidor são muito mais complexos, sobretudo do “empoderado”, que sabe o valor de cada uma de suas escolhas. O chamado consumidor consciente entende que um ato de compra traz consequências para ele mesmo, para a sociedade e para o meio ambiente, e espera das empresas um passo além: que elas assumam o papel de agentes de transformação. Este desejo não é assim tão novo. As pesquisas do Instituto Akatu — ONG que trabalha pela mobilização da sociedade para o consumo consciente — indicam que há anos o consumidor demonstra querer que as empresas sejam mais sustentáveis. Ou ao menos mais social e ambientalmente responsáveis. O que percebemos é que este desejo tem sido catalisado neste momento de fragilidade dos mercados, de vulnerabilidade do ser humano como espécie e de muita reflexão sobre a nossa maneira de produzir, consumir e viver.
Sair da caixinha
Na Pesquisa Akatu 2018, que traçou o panorama do consumo consciente no Brasil, 59% dos respondentes afirmaram que as empresas deveriam fazer mais do que está nas leis e trazer benefícios para a sociedade. No ano seguinte, a Pesquisa Vida Saudável e Sustentável, realizada pelo Akatu em parceria com a Globescan, os respondentes foram além: 55% deles disseram que os governos devem exigir que as empresas trabalhem em prol de uma sociedade melhor, mesmo que isso implique em preços mais altos.
Pois é, o consumidor diz que está disposto a privilegiar e recompensar marcas mais sustentáveis. Aquelas que consideram o seu negócio uma ferramenta de transformação social ou um meio de causar impactos positivos (ou pelo menos de reduzir os negativos) e se enxergam parte de uma economia que beneficia a todos.
Essa é uma ótima notícia para empreendedores cujos negócios se guiam pelo caminho da sustentabilidade e dos valores compartilhados — os alinhados com a visão dos criadores do 4D Sustainable Canvas. Mas é um grande desafio para quem se mantém ancorado no velho modelo do capitalismo de acionistas.
O impulso da pandemia ao consumo consciente
Há trechos do Manifesto de Davos de 2020 que as marcas deveriam repetir para si mesmas até incorporá-los em seu DNA. Segundo o documento, “uma empresa é mais do que uma unidade econômica de geração de riqueza (…) ela atende a aspirações humanas como parte de um sistema social abrangente”.
Um dos reflexos da pandemia é a potência que tais definições ganharam. Diante de uma crise global de saúde pública e da economia, em que o consumidor se vê obrigado a repensar sobre o que é essencial e supérfluo em sua vida e é instigado a adotar hábitos de consumo consciente, seu olhar se volta à atuação cotidiana das marcas.
Quais empresas mobilizaram esforços para o combate ao coronavírus? E para auxiliar realmente quem mais sofre com a crise? Que marcas abriram mão de (parte) do seu lucro para evitar a demissão de colaboradores? Quais tentam cuidar de todos os seus stakeholders: do fornecedor ao consumidor? O que é de fato ação em prol do meio ambiente e o que não passa de greenwashing?
Na resposta a essas perguntas estão inseridos os valores das empresas. E o consumidor será cada vez mais leal àquelas que têm valores com os quais ele se identifica.
Licença para operar
A mesma Pesquisa Vida Saudável e Sustentável, de 2019, fala um pouco mais sobre os fatores que justificam a lealdade do consumidor a uma determinada marca. É verdade que em primeiro lugar está “tornar a minha vida mais fácil e conveniente” (89% dos respondentes), mas não muito atrás vemos “ajudar a causar um impacto positivo na minha comunidade ou no mundo” (83%) e pouco depois “contribuir para que ser parte de um movimento maior do que eu” (69%).
Estes dados indicam que o consumidor vê nas empresas um aliado na construção de um futuro mais sustentável, saudável, justo e igualitário. Ele sabe que os atores da sociedade precisam se unir para avançar juntos nesta direção. E espera que as marcas o ajudem, cada vez mais, a fazer escolhas cujos impactos contribuam para a sustentabilidade da vida no planeta.
Esse texto foi escrito por Bruna Tiussu. A Bruna é jornalista, editora, criadora de conteúdo e gerente de projetos apaixonada pelo poder da comunicação como instrumento de mudanças sociais, culturais, políticas e econômicas. Atualmente, é gerente de comunicação do Instituto Akatu.